2009/10/01

Canadá - Outubro 2009 - pé quebrado


Cassim & Barbária versão ultra light (sem a Lu e o Amexa). Estúdio de ensaio, Montreal, 30 de Setembro.

Xuxu tranquilo, eu de pé recém quebrado e Zimmer com pressão baixa (teto preto). Estúdio de ensaio, Montreal, 30 de Setembro de 2009.


XuXu dirigindo o ensaio. Montréal, 30 de Setembro de 2009.





Público Cassim & Barbária em Montréal - 30 Setembro 2009


Nessas horas o pé não doía


Lu e nossos anfitriões, Rafa "Drausio" e Adeline, em Montréal

O ensaio no estúdio de Montréal estava indo muito bem. Bem demais. Nos meus ouvidos apitavam duas chaleiras, que não eram os samples de noise que a Lu estava operando - com muita felicidade por causa de sua eminente estreia nos palcos, e internacional! O volume muito alto me fez aproveitar o intervalo que Zimmer pediu para tomar água. Saí correndo pela rua, procurando uma farmácia que vendesse protetores de ouvido. Duas quadras e nada. Imaginando que XuXu, Zimmer e Lu estivessem impacientes a minha espera, desisti e voltei trotando. Uma mangueira daquelas que chupam merda direto para o caminhão limpa-fossa estava bem no meu caminho. Pisei nela e o pé torceu. Ouvi um estalo seco. Foi feio.

Então a noite de estreia dessa formação light de Cassim & Barbária, que aconteceu no exterior e com minha amada Lu operando os efeitos, foi pra mim dolorosa. Meu pé inchado não servia nem para acionar os pedais de efeito, quanto mais para caminhar pelo bar e fazer contatos. Não que o show não tenha sido ótimo. As trinta pessoas presentes - o bar tinha capacidade para umas 70 - ficaram aparentemente felizes, e nós também. Mas não houve trocas de informações depois disso - que é o que se pode fazer de melhor num festival.

Na manhã seguinte decidi usar meu seguro saúde de viagem e fui de taxi a um hospital na parte norte da cidade. Lu se mandou para a parte velha de Montréal para fotografar (alguém tinha que fazer Gran Turismo). O hospital com o pomposo nome Clinique Medicale Manseunneuve Rosemont era até que organizado e limpinho como era de se esperar, mas a atendente mal falava inglês e não teve muita paciência com meu Francês de péssima categoria. Fui salvo por uma senhora de 82 anos que falava a minha língua (English, of course) e que insisitiu para me fazer companhia. Estava lá para consulta de rotina que lhe daria mais um ano de carteira de motorista ("eu sem carro não sou ninguém, prefiro morrer!") e me contou histórias dolorosas sobre a filha que perdeu para o câncer, a neta que quase morreu num acidente de carro na Austrália, o marido, de quem se separou e que vive em Las Vegas e os tempos solitários em Howard Beach, Rockaway, NYC, vivendo m apês alugados de judeus hassídicos que eram legais com ela o suficiente para deixa-la morar na cobertura pagando preço de primeiro andar.
Até certo ponto, tudo parecia uma grande experiência: entrar em contato com os nativos no hospital da rede pública, onde independente da qualidade do tratamento, qualquer um se sente vulnerável, e ter uma experiência que nenhum visitante quer ter, mas que também pode ser tão pitoresca e informativa quanto visitar os pontos usuais de interesse. Contudo, depois de uma dolorosa espera de 5 horas, vi que as queixas de um Quebecois sobre o sistema público de saúde não são diferentes das que escutamos no Brasil, e isso não é exatamente legal de se constatar. Tinha uma mulher gemendo de dor com o dedo roxo quebrado e aparentemente necrosado que ficou ali gemendo por boas 2 horas até que fosse atendida. Sei bem que em nosso país esse tempo poderia ser considerado ínfimo, mas o sofrimento dela não era algo que se ignora facilmente. A dor era grande e ela teve que esperar sua vez, além de ter que lidar com uma burocraria que eu imaginava não existir mais no dito mundo desenvolvido.
Constatei que o que muda é o grau de descaso e a dramaticidade das situações. Por outro lado, vi como as pessoas aqui realmente são quando o bicho pega, e te digo que eu poderia estar em Antonina, Floripa ou Chapecó. O que muda é o superficial, a língua, os maneirismos, as roupas, a casca. Mas por mais que eu tenha me sentido privilegiado por ver tudo isso, a espera e o resultado de minha consulta foram incrivelmente desagaradáveis. O médico, que parecia o Ron Wood (mesma idade, inteiro de preto, cabelo espetado e mullet a la Rod Stewart & CO.), foi categórico: quebrou o pé, tem que ficar de molho por 6 semanas, nada de museu, caminhada no Mont Tremblant, Mont Royal, nada de mosh no show do Butthole Surfers, sossega. Isso para alguém que esperava aproveitar cada aspecto e segundo de minha viagem ao lado da Lu como se não houvesse amanhã soou como uma ficha pesada caindo no pé. Desculpem a expressão, mas fodeu!
No taxi, a caminho dos meus anfitriões Rafael "Drausio" Hadad e Adeline, arrisquei a língua gálica com certo sucesso (not really) com o motorista haitiano que me mostrou bons sons de sua terra. Cheguei a pensar que o acidente poderia ser visto como uma dádiva disfarçada (exagero otimista), que me faria aproveitar a viagem de uma maneira totalmente diferente da que estou acostumado. Pensei até que seria minha chance de aprender Francês na marra, encostado na casa de meus amigos enquanto a Lu explorava o Canadá. Mas quando ela me veio com a ideia de segui-la por aí com muletas, percebi que não vai ter moleza, e nem deve. Posso estudar Francês em casa. Ver Faust, Chain & The Gang, Yo La Tengo, o Mont Royal, Quebec city vai ter que ser in loco e by crutches.

2 comentários:

Morracarninha disse...

Uma história e tanto ao estilo Caucutá dos percalsos quebrados da vida de músico!

Panda Lemon disse...

Tadinho, Cassim!!! Que méééérd (em francês). Eu que já quebrei o pé algumas vezes (os dois, mas um de cada vez, claro) sei bem qual é a frustração de subir no palco com o pé engessado, dolorido, pulsante (mas não no exterior, né, vc é mais chique, hehehe).

Tanto que na segunda vez que quebrei e quebrei feio, até desisti de tocar. Se não me engano vc foi me substituir no Pandora esse dia, num acústico, não?

Poxa vida... o que posso desejar senão boas melhoras para o seu pezinho? Não vai ter vídeos da estréia da Lu nos palcos? Saudades... bjos