Uma grande surpresa nos aguardava no aeroporto de Guarulhos: uma velha amiga, Isa, com quem morei por alguns meses em Nova York, e também muito chegada ao Marcelus, estava no embarque com sua mãe. Isa, que mora na Bahia, e sua progenitora, que vive nos States, também estavam indo ao Peru, com Cuzco como objetivo final. Elas passariam alguns dias antes em Lima. Combinamos de nos encontrarmos na capital inca.
O voo desde Curitiba foi muito tranquilo, mas um pouco cansativo. Tive a chance de desenferrujar meu portunhol com a peruana sentada ao meu lado, que entre outras dicas, me fez anotar o nome do melhor chocolate de seu país, Sublime - ela disse que certamente nos daria energia durante as caminhadas por entre os picos nevados. Logo, as nuvens que cobriam todo o território brasileiro deram lugar a uma paisagem estupenda do altiplano boliviano, e o céu absurdamente azul nos permitiu ver os salares, parte do lago Titicaca, vulcões e La Paz. Sendo um geólogo renomado, o Presidente foi lendo os acidentes geográficos, atento às linhas que assinalavam as forças tectônicas que a moldaram, como linhas angulosas, canions abruptos e pendentes com verticalidades impressionantes que tiravam o fôlego do cara só de se imaginar as subindo.
Mas se para a maioria dos passageiros, isso assinalava o fim de uma viagem de 5 horas, para nosotros era o começo de um périplo. Do lado de fora do aeroporto, uma brisa fresca e salgada soprava do Pacífico. Como de costume em Lima por causa da umidade que vem do mar, o céu estava encoberto. Tomamos um táxi por 50 soles - cerca de 30 reais - até a estação rodoviária da empresa Cruz Del Sur, onde pouco depois embarcaríamos em um ônibus espaçoso e confortável em direção a Cuzco, numa viagem de 21 horas sem paradas. Partimos no fim do dia, e enquanto havia luz do sol, pude apreciar a paisagem desértica dos entornos da capital peruana.
No ônibus para Cuzco
Os costumeiros filmes sangrentos e comerciais de aventura foram exibidos nas telas do veículo, mas enquanto Marcelus preferiu dormir logo, eu li um pouco sobre nosso destino e os incas e ouvi no iPod o disco novo de Panda Bear, que é altamente recomendável para viagens. De vez em quando, olhava pelo vidro fumê da janela, e assim que a lua cheia apareceu, isso se tornou mais frequente. Assim que chegamos em Ica, pude ver as dunas que atraem sandboarders iluminadas pelo luar. Em seguida, o ônibus tomou a rota sudeste que começa a subir gradativamente os contrafortes dos Andes. Nas poucas vezes em que acordei, pude apreciar paisagens espetaculares e secas, cânions banhados pela luz lunar, vilarejos adormecidos no meio das montanhas.
Quando o sol nasceu, nos vimos ganhando altitude ao subir opor um grande vale cheio de montanhas muito verticais e cobertas de pedras soltas, morros de calcário com muitas grutas e cavernas. As poblaciones se revelaram em todo o camin ho e seus habitantes invariavelmente se vestiam com roupas tradicionais, especialmente as chollas com suas tranças, chapéus de abas curtas e crianças a tira-colo amarradas em panos ricamente ornados.
Atravessamos dois passos de grande altitude antes de chegar em Cuzco. |De um deles podia se ver entre as nuvens Abancay entre as nuvens lá embaixo, nós a 4 mil metros. No segundo passo, a 4250 metros, o Presidente disse que estava comerçando a sentir alguns efeitos em seu corpo, como uma dormência generalizada. Até chegar em Cuzco, tudo o que senti foi muita fome e um cansaço esperado depois de mais de 30 horas de viagem. então, logo a nossa frente, abre-se um vale abaixo todo coberto por construções marrons e de cor ocre, a primeira visão do umbigo do mundo, o centro da civilização Inca, um lugar com um passado glorioso.